sábado, 12 de maio de 2012

Dia das Mães - II


Bombons para mamãe
José Maurício Amendola

            Não sei porque cargas d’água a gente está sempre lembrando da comidinha da mãe. É o macarrão, o verdadeiro molho italiano com pedaços gostosos de carne, é a berinjela recheada, com um leve toque de azeite estrangeiro do bom, as tortas de frango, as porpetas, o rigatone ao molho acompanhado de grão de bico. E assim por diante.
            Os doces, então, nem fale! Cada um melhor que o outro. O doce de leite, o arroz-doce, pudim de queijo, caçarola italiana, nacátole, tordili. Delícia é apelido. Com o tempo, o homem se acostuma com os doces e salgados da mamãe, da esposa e da sogra. “O cuscuz que sua mãe faz ninguém faz. sensacional”, diz o marido. “É, mas a macarronada que sua mãe faz não tem igual” – responde a mulher.
            Esse tipo de diálogo me faz lembrar de uma passagem acontecida com o meu cunhado Viscardi, morador de Goiânia. Ele chegava para a mãe dele e dizia que gostava de bolinhos de arroz feitos pela sogra dele e minha. O bolinho de arroz da sogra era de arroz batido no liquidificador. O bolinho feito pela mãe era de grãos inteiros de arroz. Para sua sogra, Viscardi dizia que gostava dos bolinhos de arroz de grãos inteiros.
            Um dia, um dia as duas se encontraram, mãe e sogra, e cada uma contou o gosto do rapaz... Foi quando ficaram sabendo que ele comia bolinhos de arroz das duas com o mesmo gosto.Aliás, conseguiu fazer com que as duas trocassem as receitas.
            Certa vez eu convidei o Chiquinho da Farmácia para almoçar num domingo na minha casa. Para quem não sabe, o nome dele era Francisco Alves Ferreira e foi por mais de 40 anos dono da Farmácia Santo Antônio, a Pharma Inn de hoje. Chiquinho era solteirão, bem mais velho que eu, mas tínhamos grande amizade. Ele era um bonachão, contador de piadas e se vestia com elegância. E metido a galã.
            Pois, bem. Convidei-o para o almoço do domingo. Pedi a minha mãe que fizesse aquela macarronada que ela sabia fazer, e ela completou com filé à parmegiana e pedaços de frango à milanesa. Tudo, então combinado.
            Justo naquele domingo, no entanto, Benedito Trajano, que era presidente da Associação Atlética Ituveravense, disse que ia oferecer um churrasco para o deputado João Mendonça Falcão, presidente da Federação Paulista de Futebol. Como eu era diretor do departamento profissional de futebol do nosso Tigre do Ramal e dono da Rádio Cultura, Dito Trajano me obrigou a comparecer ao tal churrasco. Falei sobre o assunto com meus pais e pedi a eles que atendessem o melhor possível o Chiquinho e que ele me desculpasse.
            Ao meio-dia- e meia, em ponto, meu pai foi buscar o Chiquinho da Farmácia. Chiquinho disse ao meu pai : “O seu Paschoal vai me desculpar, mas não posso almoçar na sua casa. Afinal, o Zé Maurício me convidou e, ora bolas, ele mesmo não vai estar presente”. Meu pai, morrendo de vergonha do vexame argumentou: “Chiquinho, os filhos de hoje não são como antigamente”, isso ele disse há trinta e tantos anos.
            Você já notou que as mães fazem de tudo para os filhos e estes pouco ou quase nada fazem por elas? Foi pensando nisso que, quando eu tinha uns doze anos, ao sair do cinema, à noite, por volta das nove e meia, e tomar o caminho de casa, refleti um pouco. Puxa vida, mamãe faz tantas coisas para mim e nunca levei nada para ela. Entrei numa bombonière (a palavra é francesa, por isso esse leva acento aí) e comprei meia dúzia de bombons Sonho de Valsa. Mamãe vai gostar do meu gesto e dos bombons, pensei.
            Minha casa ficava na avenida Dr. Soares, ali em frente a Jomag. Era longe, naquela época. Nos primeiros vinte metros pensei que não seriam necessários seis bombons. Cinco estavam ótimos. Comi um, portanto. Mais alguns metros achei que minha mãe não iria comer tantos Sonhos de Valsa assim. Comi outro. Restaram quatro ainda. Puxa vida, era muito Sonho de Valsa. Comi mais um e depois comi outro. E outro. Até que ficou apenas um bombom para mamãe.
            Cheguei em frente de minha casa eram já dez horas da noite. Afinal, com tanto bombom na barriga tinha que andar devagar, fazer o quilo, como se dizia antigamente. Puxa vida, coitada da minha mãe, sobrou só um Sonho de Valsa. Que guloso eu fui, pensei chateado. Só um? Ah, não!
            O melhor é não chegar com apenas um Sonho de Valsa lá dentro, coitada, assim ela não vê nada, e pronto.
            Comi o último bombom da mamãe. (Jornal Regional – abril de 1960)

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